Sal

Eu estava fazendo meu jantar. Já perdi a conta disso. Eu gosto de cozinhar, mas a obrigatoriedade faz a sensação da atividade ser completamente diferente. Especialmente quando você só cozinha para você mesmo.

Eu estou sozinho. Eu moro sozinho. E eu costumava gostar de ficar sozinho. Como a maioria, gostava pois era opcional, pois eu podia escolher a hora de interagir com pessoas e a hora de ficar quieto na minha concha. Um bom equilíbrio. Mas hoje não é mais assim.

Estar sempre sozinho significa, claro, que é tudo eu. Não tenho com quem dividir responsabilidades: a tarefa de cozinhar, de lavar as louças e as roupas, de limpar a casa, regar as plantas e ir ao mercado, é sempre tudo eu. Não tenho com quem dividir prazeres: ninguém para assistir filme junto, maratonar séries, beijar na boca, dançar na sala, comentar as notícias, reclamar do frio, é sempre só eu.

Fui colocar sal na comida e vi que acabou o do pacote, só tem o do saleiro agora. Preciso comprar um saco de sal amanhã. Me fez pensar naquela frase, não sei se é um provérbio de um país distante ou apenas uma frase que avós gostam de falar: “para conhecer uma pessoa, você precisa dividir um pacote de sal com ela”.

Não que a frase requeira explicação, mas vou explicá-la: um pacote de sal, mesmo quando se cozinha com frequência, dura muito tempo. A teoria é que precisa-se de tempo ao lado de alguém para conhecê-lo, no mínimo o tempo de duração de um pacote de sal.

Lembrei dessa frase quando vi o meu sal acabando. Por quantos pacotes de sal eu passei sozinho na minha vida? Nunca fui casado, nunca morei com um namorado, nenhum dos amigos que morou comigo era muito de cozinhar. Todo sal que comprei, gastei foi só comigo.

Por quantos pacotes de sal a gente precisa passar para conhecermos, não os outros, mas nós mesmo?

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